O BRASIL MORALIZANTE DESCE NO RANKING DOS PAÍSES MAIS CORRUPTOS. Não basta o impeachment para vencer a luta contra a má gestão.

Os últimos de tantos.
Os últimos de tantos.

Apesar do impeachment de Dilma Rousseff e do consequente encolhimento do Partido dos Trabalhadores (PT) nas últimas eleições municipais, o país perdeu três posições no ranking mundial de corrupção. As conclusões publicadas pela ONG “Transparência Internacional” evidenciam que a luta contra a corrupção não se resume ao apeamento de um grupo do poder, como parcela da sociedade brasileira dá a entender através de um discurso moralizante que tomou conta do país no último ano.

O ranking de 176 países elaborado como de costume pela “Transparência Internacional” coloca o Brasil na posição número 79 com 40 pontos – a média global é de 43 pontos -, ao lado de Bielorrússia, China e Índia. A Dinamarca é o país percebido como menos corrupto no mundo, seguida de Nova Zelândia, Finlândia, Suécia, Suíça, Noruega, Singapura, Holanda, Canadá e Alemanha. Na pior posição do ranking está a Somália, antecedida de perto por Sudão do Sul e Coreia do Norte.

Do estudo podemos tirar dois recados alarmantes para o Brasil. O primeiro: considerando os últimos cinco anos, o país é um dos que mais perderam posições devido aos sucessivos escândalos de corrupção nos quais estão envolvidos políticos e empresários de primeira linha. Em 2014, o Brasil ocupava a 69ª. “Os casos de corrupção em larga escala, como os da Petrobrás e da Odebrecht no Brasil mostram como o conluio entre as empresas e políticos tira da economia nacional milhares de milhões de dólares desviados para beneficiar alguns poucos às causas da maioria”, diz o relatório da ONG. O segundo: embora o PT tenha enorme responsabilidade nos casos atuais, o combate à corrupção vai além de tirá-lo do poder.

Bruno Brandão, representante da “Transparência Internacional” para o Brasil, em entrevista para a BBC, reconheceu que o esquema da Petrobrás reproduz um padrão que é sistêmico na relação entre setor privado e poder público. “Através do suborno, são criados ambientes de negócios que privilegiam certos grupos e não são favoráveis ao interesse público e da economia em geral. Isso gera grandes distorções e desigualdades”.

Corrupção, desigualdade e violação dos direitos humanos. No relatório, a Transparência Internacional destaca que a desigualdade se reflete em vários âmbitos: da distribuição de contratos em licitações, ao eliminar chances da concorrência entre empresas de diferentes portes, à qualidade dos serviços públicos, que acabam negligenciados devido ao desvio de recursos. A concorrência desleal, criada com compra da exclusividade para a realização de uma obra pública, tem ainda efeitos no crescimento e desenvolvimento de um país. De acordo com Brandão, sem a competição para estimular a melhoria da qualidade e a busca pela excelência e eficiência, a tendência é a degradação de infraestruturas. “O desastre da infraestrutura no Brasil é fruto de um ambiente completamente controlado por cartéis e corrupção, o que gera um impacto enorme no desenvolvimento econômico e, por conseguinte, na distribuição das riquezas”.

O caso da Petrobrás é didático: o custo da corrupção foi estimado em R$ 6 bilhões, recursos que poderiam ter sido empregados em investimentos e que gerariam não só desenvolvimento para o país, mas uma maior arrecadação de impostos, que posteriormente seriam revertidos para os serviços públicos.

O especialista da “Transparência Internacional” no Brasil destaca, porém, que um impacto direto de proporções ainda maiores na desigualdade social pode ser observado no esquema investigado pela operação Zelotes. A operação revelou uma estrutura de sonegação fiscal envolvendo quadrilhas que operavam no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão vinculado ao Ministério da Fazenda. O objetivo do esquema era, através do pagamento de propina, reverter a cobrança de impostos atrasados e multas.

A Transparência Internacional também vê uma ligação entre os altos níveis de corrupção no poder público e a violação de direitos humanos, e cita com exemplo os recentes massacres em prisões do país. “Uma tragédia como essa só pode ocorrer através da corrupção em vários níveis, a começar pelo descontrole total em relação à entrada de armas dentro de penitenciárias até o envolvimento de governantes com o crime organizado”.

Longo caminho no combate à corrupção. No relatório, a “Transparência Internacional” também menciona os avanços obtidos com as investigações que descobriu esse reduto de corrupção, chamada Lava Jato. “O país mostrou que, através do trabalho independente de organismos responsáveis pela aplicação da lei, é possível responsabilizar publicamente aqueles antes considerados intocáveis”, diz a entidade no relatório que acompanha o ranking dos países corruptos e virtuosos. Reconhece, porém, que há muita coisa a fazer. Não é um bom sinal “a ausência completa do tema corrupção nos discursos do presidente (Temer) e nas ações de governo”, diz Brandão, que assinala: “Há um risco real de retrocesso”.

O que fica claro é que o problema da corrupção vai muito além do impeachment de um presidente ou de um partido e o dar-se conta disso, o mais rápido possível, deve fazer parte do amadurecimento político da sociedade brasileira.

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